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Depois de
quase desistir e voltar à insônia, dissolvi o resto da noite nesses bocejos que
enchem os olhos de lágrimas. Tive quase que me arrastar na busca dos remédios
cor de contas. Eles se escondiam nas dezenas de velhas e trancafiadas gavetas
do meu quarto, onde blatídeos a tudo empesteavam.
Se quase
tudo tinha um cheiro entre o mofo e a naftalina, era porque tudo, inclusive eu,
estava guardado ali, como num baú de insignificâncias, cultivadas na vã espera
de ressecar aos poucos ao invés de simplesmente morrer.
Ressecar e
permanecer eterno, suspeito, é como um sonho dos que envelhecem.
Como negar um
medo, o mesmo que até há pouco chamei de infantil, um medo que me acompanha
como uma tocha que mesmo nos ventos mais fortes não se apaga?
E os
remédios também davam ares de insuficiências. A última dose, anterior à noite
de agonias, não tivera efeito e por causa disso não apaguei como desejara. E
eu me vi apenas impotente, como se enterrado vivo, sentindo na inércia, os
insetos me roubarem em agonia, o sangue, sem que eu os pudesse esmagar.
Desapontado, concluí que
eu carecia adicionar mais cores ao punhado de psicotrópicos, barbitúricos, calmantes...
antidepressivos... analgésicos inúteis e fugas.
Adicionar mais
e mais cores às minhas fugas. Uma alegre ironia dos planos.
Enfim, engoli
a dose seguinte, três goles a mais, a garganta seca.
No peito a suspeita: não
seria apenas covardia? E se fosse um tiro? Na garganta? Uma corda que separasse
o pescoço da espinha, ou mesmo um gás que me estourasse o peito?
O amargo da
química escorregava como um bolo travoso e insuportável. Por dois segundo fui
senhor de minha razão, senhor das minhas últimas decisões.
E tudo veio
surgindo. Fantasmas em mim. Vinham surgindo como surgem os arrepios...
E o
arrependimento, apenas um sonho distante no qual eu poderia ter me agarrado,
uma quimera invencível diante de um fraco...
Aos heróis
de si mesmos, tudo o que afaga mora no passado.
E foi
assim...
Descobri que
o futuro é um não querer pensar por já se estar farto da espera; um tecido negro que encobre o jardim florido; um pássaro livre que nunca voa porque não se reconhece sem a flor do chão.
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