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“Houve uma interferência na
pureza daquilo . Lembro que ao início eu conseguia escrever palavras as quais depois conseguia admirar.
Era como se uma voz me as ditasse de
muito perto aos ouvidos.
Mas agora já não consigo escreve-las
porque já não há a mesma construção de outrora, que eu vislumbrava seguramente
assim que desejasse. Algo se quebrou, diria o dramático. A bela corrente fluida
de sensações foi maltratada e se rompeu, diria o triste. Mas ainda sobraram
textos daquele momento. Textos que admiro até, por ensinarem boas lições a mim
mesmo que os escrevi. Felizmente, diria o que espera sempre.
Demorará a recuperação
daquilo que se rompeu. [ou nunca se recuperará]
Depois disso novas palavras surgirão e eu já
serei um outro que para isso não mais escreverá.
Então, assim me contento em
revelar o que me veio até minutos antes do melhor que surgiu em mim se acabar. É que depois... já quase nada sobre
isso consigo escrever”.
RESQUÍCIOS
Disse-me que os ruídos
carregam milhares de elementos os quais compreendemos e que estão escondidos
neles. Essas coisas me foram ditas no tempo onde tudo o que eu ouvia eu ainda
não entendia, e por não entender, era
parte de mim e me era suficiente desse modo, até mesmo por não haver ainda em
mim ausência ou necessidade alguma.
Assim, quando eu sorria, não
fazia isso porque as coisas me agradassem, fazia-o por nem saber que a consonância de tudo o que me
rodeava era parte de mim assim como eu era parte de tudo.
Agora ele não me diz o que tenho ouvido desde que aprendi a designar
as coisas por palavras. Diz-me o que me cala, revela vagos naquilo que digo e
me joga num silêncio que me mostra a mim mesmo ainda em construção.
Calo-me. E meu calar é uma
resignação na qual encontro sabedoria e acalanto.
Calo-me e observo com os olhos
atentos e com o semblante dos tímidos. Por muitas vezes me encontro numa
tristeza estranha por estar assim em tal estado de espera e silêncio e é nesses
momentos que seus sussurros me fazem companhia.
Senta aqui ao meu lado,
diz-me a preparar o lugar onde na cama
devo me acomodar, tenho coisas a te contar, coisas que o mundo não revela assim
de pronto, coisas que não é possível ver com os teus olhos. Por isso te peço que te abstenhas desse
sentido falho e te deixes a mim por
inteiro, como se jogasse numa queda sem volta por saber que neste meu universo não é possível a existência de um
chão firme. Feche os olhos para falar comigo e abra para si mesmo os ouvidos.
Estou dentro, escondido naquilo que tu nem sabes que guardas com tanto esmero.
O melhor recanto de tua alma é onde moro, e serão poucos os que te olharão e
terão a capacidade de enxergar isso. E quando este alguém chegar, saberás. Ele
terá os olhos que te farão desejar abrir os verdadeiros teus. Aquilo que junto
a mim guardei em ti será revelado e revelador, assim como o sol num dia frio,
que vem trazer a luz, a vida e a espera da primeira noite após a primeira
alvorada.
Por algum motivo inicial, eu
acabava por entender sua voz no desejo meu de fazer coisas que vinham de mim
sem que eu soubesse como. Havia uma fonte de onde tais fluídos jorravam,e eu
sem por saber algum acabava por me ver envolvido na construção de elementos
maravilhosos e assim me sentia muito feliz por
ter a capacidade de descobrir em mim essas dádivas.
Por vezes muitas está ao
longe, e assim o percebo a ser trazido. Alcança-me em partículas para que eu
sinta a imensidão de sua existência. Essas partículas me são trazidas assim,
como em vento, ou despencando de um despenhadeiro, ou caindo como chuva, ou
ruindo como uma grande torre .
Cada partícula sua é um
universo que me atravessa. Sua soma é o que me atinge. Sua presença através de
mim é o que me multiplica. Não sou mais um? Eu indago. Ès milhares, mais
milhares que os infindos milhares, ele responde, com um riso travesso.
Sim, ouço sua voz e seu riso.
Não é um ouvir.
Não é um sentir ou um somente
perceber.
Fecho os olhos apenas e deixo
que suas subdivisões infinitas tomem
conta de mim. Sou parte delas. Elas são as formadoras daquilo que sou por agora
e do que serei e do que até mesmo fui.
Vou te dizer a minha maior
verdade: Eu posso falar com ele e ele me ouve como se fosse uma criança atenta
ao que digo. Ele me coloca ao seu colo e
me dá carinho. È aquele que sabe de mim
antes mesmo que eu mesmo o soubesse.
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