sexta-feira, 14 de novembro de 2014

O APRENDIZ DA ROTINA 3

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POR ONTEM

"Muitas vezes  me falas em navegar. supões que entremos num barco e sigamos num desrumo qualquer.  a nos libertar da margem, essa margem que nos prende. e nós, humanos, tão acostumados a somente dar passos...  é como se aquilo que somos fosse em maior parte construído por vontades".

navegar...

tenho assim pensado nestes últimos dias. tenho essa impressão de não mais estar em terra firme e ainda assim me sentir ancorado. nasci para este perigo? nasci para criar mundos  nessas certezas sem tranquilidade?

temos andado  sob o sol. temos observado as sutilezas do chafariz. estamos nos descobrindo - como se a cada dia nossa imagem fosse a ficar ainda mais nítida. temos nos divertido com nossos acidentes, com os pássaros e lagartos que nos miram. temos escolhido lugares para serem nossos lugares e deles mal temos conseguido escapar, tal é a força que imprimem contra nós. há essa fluidez que nos move, estamos em busca de receptáculos. estamos a construir uma pequena eternidade à luz que escapa de uma janela de vidros coloridos.

dividir com quem essa alegria?
 como dizer que por muito tempo as dores não me deixaram sorrir como agora? como dizer isso de que tenho a impressão de estar definitivamente desperto?


sim...  estamos a caçar desenhos de janelas que revelam a chuva. temos vislumbrado a beleza dos reflexos de um palco nos espelhos d'água. ouço o sussuro franco de sua fala, poesias em outra língua que não entendo. meu devir vacila, minhas mãos  gesticulam formas abstratas no ar. tu ries  destes gestos do mesmo modo que um recém nascido ri para os movimentos facias de um desconhecido.

e volta e meia te pergunto e te revelo que ainda assim temo o retorno a ser o que estive a ser. o  náufrago é presenteado por um barco sem remos e se deixa em deriva. sabe que estar assim levado pelo mar é melhor que estar preso numa ilha. e teme que por um capricho das procelas acabe por cair de volta a esta praia de sossego e esconderijo que por tanto tempo  o abrigou em solidão e tristeza.


o amor é atonal

eterna ressurreição, possível de se encharcar  com milhóes de significados.





ao estender as mãos, correu a mim aquela que por tanto se escondera. ela estava num labirinto e eu a encontrei. acolhi seu corpo em meu colo e algum poder em mim nela se fez efeito. e foi assim, a amei desde o início. o embrião está envolvido  por aquilo que lhe dá geração.

desde o início.


vamos construir um barco, tu me dizes. vamos construir uma asa delta. vamos embora daqui. pode haver sentido nessas frases? o malabarista com suas carambelas está sendo convidado  a bailar apertado ao corpo da  musa do baile da cidade. ele se sente ainda demasiado lento. mas sua alma corre muito mais que seu corpo. assim se reconhece os desejos como se reconhece estrelas cadentes.


ela entrou na casa dos risos proibidos e lá em seu  interior acendeu luzes, pediu sorvetes, cantarolou a balançar o corpo e riu gostosamente do polichinelo.

estamos a construir nossa nau para travessia. estamos a quase nos deixar em asa delta por sobre as cabeças pensantes. estamos a procurar sons e imagens para isso com a suspeita que temos essa energia divina a guiar tudo o que somos?







te deixei estar muito perto, dentro, daquilo que me forma. teu olhar alcança o meu titereiro e um riso sutil é o que de ti tenho como maior declaração de amor. e mesmo sedento não me deixo saciar por completo...






tenho falado que meu anseio é o que me constrói. sou uma nova estrutura. reformulada pelas mãos daquela que nasceu para moldar o que sempre fui:

um amontoado de imagens furtivas


que só agora a mim começam a tomar sentido.
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