terça-feira, 7 de dezembro de 2010

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EXNORT 5

Ouvindo Fritz kreisler o homem de tapaolho ainda sente forças, depois de cinquenta anos para se meter na árdua tarefa de manter escondido numa caixa de asbesto a figura dividida num quebracabeça de cinco mil peças?

não. ele já morre. e agora ao olhar para seus esforços passados sente-se um tolo que sustenta um segredo sobre o esconderijo de algo que tampouco conhece. adoecido e sem forças, numa última tentativa, tenta remontar algumas peças. é tarde, se aqui lobos costumassem vagar, ouviria-se seus uivos ao longe, no desvario absurdo da casa... e da noite.

é tarde, aos olhos do velho homem que se fecham sem que ele tenha pelo menos vislumbrado parte pequena sequer da figura que as milhares de peças unidas revelariam.

herdeiro descuidado do espólio do avô, Exnort deixa com o tempo que pela casa se espalhe o quebracabeça de cinco mil peças...

para o quebracabeça espalhado pela casa, seria a casa que estaria em perfeita desordem, despedaçada em cinco mil compartimentos, jogada ao fundo imensurável do vazio e do acaso.

certa vez, assustou-se com um acontecimento bem simples. Delatoria apareceu de manhã com uma das pequenas peças penduradas ao pescoço, dizendo que a encontrara perto da janela. A pequena achou-a tão bela, de cores tão vibrantes que não viu problema em usá-la como pingente. Exnort sentiu-se como jamais antes se sentira. um arrependimento, um desalento descuidado, uma vontade de lamentar pelo impossível que seria reencontar o todo que foi perdido, unificar as partes celulares de um corpo muito mais extenso de algo cuja fisionomia seria impossível de descrever sem ver por inteiro, revelando através de um único olhar toda sua graça e seu milagre.

mas era já tão tarde.

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