terça-feira, 12 de novembro de 2013

cronicas do teatro pobre

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A família era grande demais para que sobrasse tempo à arte. Arte, que porra é essa?

A frustração da liberdade dissolvida num tempo de contagotas. Na chegada à casa - paga mensalmente como quem joga cédulas através da janela, os filhos amorosamente enfileirados em suas infâncias... um arremedo desfigurado de uma família dinamicamente feliz, mal se deixam distrair, preferem as telas, o consumo exagerado das energias elétricas, ainda que aparentemente aprisionados nesse medo que habita os olhos da infância.

A obrigação do amor. A chance de fugir, escapulir através desses seres vivos espalhados pelo tempo. "A vida deles é a desculpa deslavada para a surdez da minha"

"Deixei uns livros pela metade"...

"Eu gostava de escrever"...

Anjos voadores; desafiadores de nuvens. Os olhos se abrem na madrugada, secos. Nenhum pensamento que justifique o desaparecimento do sono. "Talvez eu tenha caído nisso por pura obra do acaso". Se nada do talento nessa construção se instala, o que sobra de ganho? Dinheiro? Gorgetas?

"Ela cismou de cantar". De repente, naqueles tempos, pintou uma confiança, uma confiança com cara de sorte grande. "Se ela vingasse, pelo menor carregaria na bolsa de suas cantigas alguns dos meus versos". 

Costumava gastar alguns minutos fazendo poemas de amor. Ruins de doer. Maldita juventude perdida. Maldita vontade de estar em casa, sem estar perdendo tempo com este mundo de dementes, "de pederastas pervertidos", artistas de falsa profecia. Andar no meio dessa gente, que tédio, "me forçar a parecer um deles", isso causa alguma doença grave no espírito. No final de tudo; no final das contas sobra apenas o homem ornado de calças curtas, atravessando a rua em busca desesperada por pilhas alcalinas.

"Sensualizar a minha masculinidade ao extremo para desenhar em mim um rascunho de um plano que não cumpri". Talvez lhe falte a mesma  força masculina de heróis mesmo menores, daqueles heróis que nada fazem além de ajudar velhinhas a carregar as compras da feira. E as aventuras? E o chistes? E a peraltice das mentiras desmoralizantes? Pobre Ulrich...

Quem te viu quem te vê...

O travesseiro ou um grande vazio das horas?

Os olhos secos não somente pela insônia...

"Escondo minha vida nessa casa alugada onde escondo minha prole. Se não fosse um bairro tão violento, eu desceria um pouco... respiraria um pouco o ar da noite e deixaria por um instante de pensar nos meus fracassos, ou deixaria de usar as consequências de minhas escolhas como coisas grandiosas...

Melhor ligar o computador...

me divertir com pornografias. Foda-se todo o resto".


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